FHC ouviu o galo cantar; achou que era um tucano

14/07/2012

Por Saul Leblon no site Carta Maior

Fernando Henrique Cardoso recebeu um prêmio da Biblioteca do Congresso dos EUA, cuja primeira edição agraciou a tradição dos intelectuais arrependidos da esquerda. O polonês Leszek Kolakowski inaugurou a fila do ‘Pluge’ em 2003 depois de concluir uma baldeação do marxismo ortodoxo à rejeição radical da obra de Marx, classificada por ele como a ‘maior ilusão do século XX”. No caso de FHC, o prêmio de U$ 1 milhão brindou os desdobramentos políticos de suas reflexões sobre a dependência. No entender dos curadores, elas teriam demonstrado como os países periféricos ‘podem fazer escolhas inteligentes e estratégicas’ (leia-se dentro dos marcos dos livres mercados) mesmo estando em desvantagens em relação às nações industrializadas”.

O tucano não decepcionou. Na entrevista após embolsar o galardão falou grosso. E acusou Lula de ser responsável pelas agruras atuais da indústria nativa (perda de competitividade e de peso no PIB), ao interromper as reformas liberalizantes. Isso mesmo, aquelas das quais seu governo foi um instrumento e cuja correspondência no plano internacional, como se verifica, legou-nos um mundo de fastígio e virtudes sociais. O diagnóstico do sociólogo, como se sabe, vem ancorado em atilada visão macroeconômica.

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O escrutínio da austeridade

06/05/2012

Por Saul Leblon no site Carta Maior

Se alguém passou distraído por três décadas de domínio neoliberal, os últimos quatro anos ofereceram a oportunidade ímpar de acesso a um compacto eletrizante com as melhores (piores?) cenas do que é capaz  a convergência entre finanças desreguladas e austeridade suicida. A vítima desse condensado pedagógico é o  corpo social europeu mutilado por governantes armados do firme propósito de privilegiar bancos e credores, ao mesmo tempo em que sacrificam direitos, leis trabalhistas, serviços e investimentos públicos.

As cenas finais dessa imolação tangida pelo chicote germânico de Angela Merkel mostram uma montanha desordenada de escombros sociais e políticos arrematada por 17 milhões de desempregados – recorde europeu no pós-guerra.  O conjunto faz da UE hoje a sigla tenebrosa de uma empresa demolidora que devasta a mais sólida rede de conquistas da civilização imposta ao capitalismo pela luta progressista dos últimos 60 anos: o hoje esquelético Estado do Bem Estar Social europeu.

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O poder em jogo nas urnas de maio

26/04/2012

Por Saul Leblon no site Carta Maior

Durante 30 anos o discernimento histórico foi entorpecido pela radiola do pensamento único, a proclamar as virtudes e a autossuficiência da ordenação da sociedade sob a égide dos livres mercados. O dinheiro solto era mais eficiente que o desenvolvimento planejado.

Mais que um martelar teórico, tornou-se a única experiência tangível em escala relevante, sendo a sua crítica um exercício mais de resistência ideológica, do que uma confrontação prática de experiências e projetos. Esse tempo acabou.

Hoje a opinião pública mundial desfruta o privilégio de comparar lógicas divergentes em ação. Nesse acerto de contas cabe à Europa, que figurou no pós-guerra como um contraponto de democracia social ao capitalismo americano, o enredo da tragédia. Assiste-se ali à derrocada de nações que mergulharam na crise de 2008 subordinadas à supremacia das finanças desreguladas e, mais que isso, desprovidas de lideranças capazes de resgatá-las da austeridade suicida, quando a sobrevivência do modelo tornou-se sinônimo de sacrifício terminal.

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A crucificação de Cristo, o suicídio e a rebelião em Atenas

07/04/2012

por Mauro Santayana 

publicado no JB e no Conversa Afiada

O homem que prenderam, interrogaram, torturaram, humilharam, escarneceram e crucificaram, na Palestina de há quase dois mil anos, foi, conforme os Evangelhos, um ativista revolucionário. Ele contestava a ordem dominante, ao anunciar a sua substituição pelo reino de Deus. O reino de Deus, em sua pregação, era o reino do amor, da solidariedade, da igualdade. Mas não hesitou em chicotear os mercadores do templo, que antecipavam, com seus lucros à sombra de Deus, o que iriam fazer, bem mais tarde, papas como Rodrigo Bórgia, Giullio della Rovere, Giovanni Médici,  e cardeais como os dirigentes do Banco Ambrosiano, em tempos bem recentes. O papa reinante hoje, tão indulgente com os gravíssimos pecados de muitos de sua grei, decidiu, ex-catedra, que as mulheres não podem exercer o sacerdócio.

Ao longo da História, duas têm sido as imagens daquele rapaz de Nazaré. Uma é a do filho único de Deus, havido na  concepção de uma jovem virgem, escolhida pelo Criador. Outra, a do homem comum, nascido como todos os outros seres humanos, em circunstâncias de tempo e lugar que o fizeram um pregador, continuador da missão de seu primo, João Batista, decapitado porque ameaçava o poder de Herodes Antipas. Tanto João, quanto Jesus, foram, como seriam, em qualquer tempo e lugar, inimigos da ordem que privilegiava os poderosos. Por isso – e não por outra razão – foram assassinados, decapitado um, crucificado o outro.

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Os banqueiros não desistem

13/11/2011
Carta Maior

Para que se incluam na sociedade humana os marginalizados de hoje, é preciso dela excluir os verdadeiros marginais: os grandes banqueiros privados e seus poderosos clientes. Não é o que está acontecendo na Europa, onde os banqueiros estão assumindo o poder em lugar de líderes fracos e acovardados.

Mauro Santayana

A Europa entrou em um vácuo político, e os banqueiros estão assumindo o poder em lugar dos líderes fracos e acovardados, que, desprovidos de inteligência e legitimidade, não souberam conduzir o processo. Tanto na Itália, quanto na Grécia – em nome da racionalidade técnica, que bem conhecemos aqui – são notórios serviçais do sistema financeiro internacional os escolhidos, para intervir nos governos nacionais, pelo Goldman Sachs, mediante o Banco Central Europeu.

Sua missão é simples: pagar aos bancos credores a dívida dos dois países. Para reunir os recursos necessários, a receita é velha, e nós também a conhecemos, quando economistas medíocres do FMI nos visitavam e cortavam, nos orçamentos nacionais, os investimentos sociais, a fim de que sobrassem recursos para a rolagem da dívida externa.

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O que mudou e o que não mudou nestes 10 anos

12/09/2011

Balaio do Kotscho

Pedem-me para escrever sobre os 10 anos do 11 de setembro. Confesso que nem sei por onde começar, depois de tudo o que li, vi e ouvi nestes últimos dias sobre o atentado que mudou o mundo e deixou um sentimento de perplexidade, medo e impotência em todos nós.

As imagens dos dois aviões explodindo contra as torres gêmeas do WTC em Nova York já foram repetidas à exaustão milhões e milhões de vezes pelas TVs de todo mundo. Desde a chegada do homem à Lua, não se via cobertura jornalística tão massacrante, onipresente, comentada.

Em 1969, sentimos orgulho da nossa condição de humanos; em 2001, vergonha. O protagonismo americano se fez presente nos dois episódios que marcaram a última metade do século.

Como é impossível ignorar o marco histórico que hoje completa 10 anos, reproduzo abaixo uma pequena lista do que mudou e do que não mudou no mundo neste período, que preparei para me servir como roteiro no programa especial comandado pelo Heródoto Barbeiro, gravado na sexta-feira e que vai ao ar hoje, às 22 horas, pela Record News.

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Por que a oposição não fala de economia?

20/07/2011

Agência Carta Maior

O PSDB, o jornal O Globo e seus aliados estão indignados com a corrupção no Brasil. Querem que o povo saia às ruas. Mas o povo só costuma sair às ruas quando a economia vai mal. E, curiosamente, aqueles que querem que o povo saia às ruas, não querem falar de economia. Distração? Falta de ter o quê dizer?

Marco Aurélio Weissheimer

Subitamente, setores da sociedade brasileira querem que o povo saia às ruas. É preciso qualificar esses “setores da sociedade brasileira”. São aqueles que foram apeados do poder político no início dos anos 2000 e que tiveram sua agenda política e econômica dilacerada pela realidade. A globalização econômica cantada em prosa e verso nos anos 1990 revelou-se um fracasso retumbante. A globalização financeira, a única que houve, afundou em uma crise dramática que drenou bilhões de dólares da economia real, conta que, agora, está sendo paga por quem costuma pagar essas lambanças: o povo trabalhador que vive da renda de seu trabalho.

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Estudo mostra que no Brasil os ricos reclamam de boca cheia

25/06/2011

Blog da Cris Rodrigues

Quem mais reclama dos impostos cobrados no Brasil paga pouco, na comparação com outros países. São, aliás, os mesmos que gostam de citar exemplos de nações de “primeiro mundo” para reclamar menos preservação ambiental, mais liberdade aos mercados etc. São representados pela imprensa tradicional e conservadora, que reproduz e realimenta o discurso único, sempre igual, sempre tão pouco plural. São também chamados de elite.

“O estudo [feito pela rede UHY] indicou que um profissional no Brasil que recebe até US$ 25 mil por ano – cerca de R$ 3.300 por mês – leva, após o pagamento de Imposto de Renda e Previdência, 84% do seu salário para casa. Já os profissionais que recebem US$ 200 mil por ano – cerca de R$ 26.600 por mês – recebem no final cerca de 74% de seu pagamento”, informa a Rede Brasil Atual, e acrescenta que essa diferença de 10 pontos percentuais é uma das menores do mundo, a ponto de a própria rede UHY considerar nossa carga tributária “esdrúxula”.

A Holanda é citada como exemplo positivo de incentivo a uma maior igualdade. No país europeu, a diferença entre o percentual de salário que sobra descontados os tributos dos profissionais de salário menos alto, dentro da faixa dos US$ 25 mil anuais, e dos mais ricos, é bem maior: de 84,3% para 45%.

O Brasil “ganha” de Dubai, Rússia, Estônia, Egito, Índia e México, entre os países analisados.

Enquanto isso, qualquer iniciativa para mudar a arrecadação tributária, aumentando a conta dos maiores salários, é criticada como uma espoliação ilegítima por parte do Estado. Vale lembrar que a arrecadação de impostos serve para garantir os serviços oferecidos pelo Estado, como saúde, educação, segurança, transporte etc. Ou seja, uma maior taxação sobre os salários mais altos poderia significar não apenas uma menor desigualdade numérica simples, mas reverter em mais qualidade de vida para os mais pobres (aqueles que sequer aparecem no estudo).

Gráfico da BBC Brasil


A economia fala mais alto

03/06/2011

por Eason Nascimento

Não há como negar, que o governo Dilma passa por uma fase conturbada, com as denúncias contra o ministro Antonio Palocci, bem como pela aprovação do Código Florestal na Câmara. Este último fato comprovou uma desorganizada atuação da base governista, desvinculada, o que é mais grave, da orientação governista.

A mídia enquanto amplifica o tema Palocci, já se aventura em apontar nomes prováveis para substituí-lo. Além de atacar as obras da Copa do Mundo, que segundo ela não serão concluídas a tempo, insinuam gravidades no estado de saúde da Presidenta. Sobre Dilma, a revista Época passou dos limites com a capa em que procura mostrá-la como se cadáver já fosse. Uma mistura de maldade com má fé que demonstra a disposição do semanário da família Marinho no trato da questão.

Nem a revista Carta Capital escapou.  A capa da edição 648, mostra Dilma com a mão sobre o rosto, como se já estivesse cansada, e abatida. O artigo de seu redator chefe, Mino Carta, faz um relato da situação atual e conclui fulminante : “o PT esqueceu os trabalhadores e tornou-se um partido  igual aos demais”. Mesmo assim, diga-se de passagem, Carta Capital, está a quilômetros de distância das intenções de Veja, Época, IstoÉ, Folha, Estadão ou Globo.

A passagem de Lula por Brasíla, na tentativa de “arrumar” os conflitos da base, principalmente entre PT e PMDB, deixou evidente a falta de uma coordenação política eficiente dentro do governo, para debelar focos de insatisfação, o que serve de combustível para os veículos midiáticos se nutrirem.

Ainda bem que a queda do preço da gasolina e do álcool, o recuo do déficit externo, o superávit primário que superou a meta do quadrimestre, além do baixo nível de desemprego e do recrudescimento dos índices de inflação são indicadores do equilíbrio da economia do país.  É este equilíbrio que nos garante que esta crise, restrita à área política,  não chegará no povo.

Afinal de contas, a economia sempre falou mais alto e vai continuar falando.

Em tempo : A entrevista do ministro Palocci minutos atrás no JN, em nada modifica  o quadro.


O martírio de William Waak

05/04/2011

Eason Nascimento

Um princípio de insônia me levou a assistir nesta segunda-feira(4), parte do Jornal da Globo. Por conhecer o perfil do tele jornal e de seus apresentadores, dificilmente troco minhas horas de sono por este tipo de masoquismo causador de pesadelos.

A pauta vinha sendo apresentada sem maiores sobressaltos até William Waak anunciar  a próxima notícia, antes de ir para o intervalo : “Agência de risco Fitch melhorou a nota do Brasil”. Neste momento tomei um susto. A cara do apresentador foi algo digno de registro. Seu semblante se abateu, sua voz ficou embargada, sua tristeza ficou evidente.

Ao retornar do intervalo leu toda a matéria dando conta que desde 2008 o Brasil faz parte de um clube seleto de países considerados seguros para investir. Hoje subiu mais um degrau, afirmou o jornalista global sem disfarçar a decepção. E continuou “a  agência internacional de classificação de risco melhorou a nota – o Rating – do país, indicador que demonstra a  capacidade do país de honrar suas dívidas no prazo esperado, segundo palavras do diretor executivo da Fitch Brasil, Rafael Guedes”.

Para efetuar esta classificação, as agências levam em consideração vários indicadores de natureza econômica como PIB, inflação, investimentos, reservas internacionais, o endividamento e calculam o risco de o país não conseguir pagar seus credores.  Segundo a agência, o Brasil deve crescer entre 4% e 5% e deve manter a relação da dívida em patamares seguros, comparada ao PIB. A solidez da economia atrai investimentos externos e dólares e preocupa alguns analistas econômicos. O ministro da fazenda Guido Mantega afirmou :  é melhor ter problemas de excesso de dólares ao invés de ausência, como ocorria no passado.

A sensação de alívio na cara do apresentador surgiu quando passou para outro tema. Neste momento meu sono chegou e dormi tranqüilo, certo de ter testemunhado o martírio de William Waak. Valeu a pena.