Brasil: um anacronismo chamado “direita”

31/10/2012

Por Flávio Aguiar no site Carta Maior (*)

“O senhor Getúlio Vargas, senador, não deve ser candidato à Presidência. Candidato, não deve ser eleito. Eleito, não deve tomar posse. Empossado, devemos recorrer à revolução para impedi-lo de governar.” Carlos Lacerda, em 1º. De junho de 1950, no jornal Tribuna da Imprensa.
Visto de longe (apesar da imediatez  da internet, mas ela também distancia) o Brasil continua parecendo um desajuste temporal.

Antigamente, quando o Brasil era o país do futuro, ele parecia um túnel do tempo, rumando do passado (atraso) para a modernidade (progresso) mais ou menos conservadora, conforme o gosto do freguês. Ou dos donos da loja, do futuro, do poder e  do Brasil. Houve aquele intervalo de um certo período milagroso da ditadura, quando esta apregoava: “agora, o futuro chegou”. E o futuro não era um sonho, era um pesadelo.

Agora as coisas estão um pouco diferentes. De algum modo, aos trancos e barrancos, o futuro, de novo, chegou. Mas desta vez chegou mesmo. O Brasil continua com suas desigualdades, com seus achaques, com seus muros da vergonha social. Mas de algum modo está avançando em melhorar a vida de seus cidadãos, em todos os sentidos. Enquanto em boa parte do resto do mundo – inclusive aqui na Europa “desenvolvida” – as sociedades marcham em sentido contrário.

Mas no Brasil há um lastro chamado direita. Que não aceita, inclusive, esse nome. Talvez seu problema começa aí: um problema de identidade, de nascença, de família, sei lá. O mote da direita brasileira continua sendo aquela famosa frase de Carlos Lacerda sobre Getúlio Vargas, proferida em 1950.

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A piracema progressista

30/10/2012

Por Saul Leblon no site Carta Maior

Vista a partir de retinas embaçadas de cansaço ou ideologia, a transformação social parece uma impossibilidade aprisionada em seus próprios termos: as coisas não mudam, se as coisas não  mudarem; e se as coisas não mudarem, as coisas não mudam…

O sistema de produção baseado na mercadoria cria e apodrece previamente as pontes  das quais depende a travessia para uma sociedade justa e  virtuosa.

Rompe-se  o lacre da fatalidade no pulo do gato  das sinapses entre condições objetivas e subjetivas, diz a concepção materialista da história. Mas a dialética dura das transformações não é uma mecânica hidráulica. Não é maquinaria lubrificada, autopropelida a toque de botão.

A história é um labirinto de contradições, uma geringonça que emperra e se arrasta, desperdiça energia e cospe parafusos por onde passa.  Para surgir um ‘Lula’  desse emaranhado tem que sacudir muito a estrutura. Greves, levantes, porradas, descaminhos  etc. Dói. Demora. Décadas, às vezes séculos.

Uma liderança desse tipo – e aquelas ao seu redor; ‘uma quadrilha’, diz o vulgo conservador – constitui um patrimônio inestimável. Mesmo assim, é só o começo; fica longe do resolvido.

A ‘pureza’ política pretendida por alguns juízes do STF é pouco mais que uma bobagem de tanga disfarçada de toga diante do cipoal da história.

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São Paulo amadureceu pela dor

28/10/2012

Por Eduardo Guimarães no Blog da Cidadania

São Paulo está dando o primeiro passo para começar a se livrar de uma quadrilha formada por dois partidos que, há uma década, apesar de subsistirem em terras paulistas, o Brasil vem rejeitando progressivamente: o PSDB e o DEM. E por um consórcio de impérios de comunicação que atingiu o porte paquidérmico que tem hoje graças às incontáveis arcas de dinheiro público que recebeu da ditadura militar pelos favores que lhe prestou.

José Serra, o lunático que o povo de São Paulo ora manda para a aposentadoria, tem todas as características de capo: autoritário, impiedoso, preconceituoso, truculento, cínico e, segundo o livro A Privataria Tucana, desonesto – sua filha e outros parentes, enquanto o governo federal do PSDB vendia patrimônio público a preço de banana, recebiam milhões e milhões de dólares de remessas inexplicáveis do exterior.

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A última eleição sob a tutela da Globo

25/10/2012

Por Saul Leblon no site Carta Maior

A sólida dianteira de Haddad em SP, reafirmada pelo Ibope e o Datafolha desta 5ª feira, deixa ao conservadorismo pouca margem para reverter uma vitória histórica do PT; talvez  a derradeira  derrota política do seu eterno delfim, José Serra. Ainda assim há riscos. Não são pequenos. Eles advém menos da vontade aparentemente definida do eleitor, do que da disposição midiática  para manipulá-la, nas poucas horas que antecedem o pleito de domingo.

Há alguma coisa de profundamente errado com a liberdade de expressão num país quando, a cada escrutínio eleitoral, a maior preocupação de uma parte da opinião pública e dos partidos, nos estertores de uma campanha como agora, desloca-se propriamente do embate final de idéias, para prevenir-se contra a  ‘emboscada da véspera”.

Não se argui se ela virá; apenas como e quando a maior emissora de televisão agirá na tentativa de raptar o discernimento soberano da população, sobrepondo-lhe seus critérios, preferências e interditos.

Tornou-se uma aflita tradição nacional acompanhar a contagem regressiva dessa fatalidade.
A colisão entre a festa democrática e a usurpação da vontade das urnas por um interdito que se pronuncia de véspera, desgraçadamente instalou-se no calendário  eleitoral. E o corrói por dentro, como uma doença maligna que pode invalidar a democracia e desfibrar a sociedade.

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Depois de Malafaia, Serra evoca Lombroso

24/10/2012

Por Saul Leblon no Carta Maior

Quem achava que depois da caça ao kit gay estaria esgotado o estoque de excrescências desta campanha, errou. A quatro dias das eleições municipais de 2012, Serra revira seus guardados no saco do desespero. Elege um truque por dia. Enfia os pés pelas mãos. Como se tentasse correr na areia movediça, transforma sua campanha num atoleiro. Desta vez foi fundo demais.

Os impulsos que o desespero desencadeia provocam calafrios em círculos tucanos mais serenos. A essa altura, tudo o que pedem é que o 28 de outubro chegue logo.

Nesta terça-feira, em entrevista à amigável rádio CBN (emissora das organizações Globo), o candidato que trouxe o obscurantismo religioso ao centro da disputa, ungindo Silas Malafaia em assessor para os bons costumes, metabolizou Cesare Lombroso.

O tucano – se eleito – pretende criar nada menos que um programa de monitoramento de jovens com ‘propensão’ para cometer crimes.
Em resumo,  criminalizar antes aqueles que se considere potencialmente criminosos.

Como? Acompanhe. Seria um braço da Febem agindo, secretamente supõe-se, dentro das escolas das periferias, naturalmente.
Objetivo:  vigiar jovens que, nas palavras do candidato José Serra: “Ainda não entraram para o mundo do crime (frise-se o ‘ainda’), “mas que podem ter propensão para isso”.

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Quem não tem voto diz que eleitor está cansado

21/10/2012

Paulo Moreira Leite na Época

Pergunto o que leva nossos coveiros de sorriso amarelo a produzir tantas análises e raciocínios sofisticadíssimos para esconder o dado óbvio desta eleição municipal.

Apesar do julgamento do mensalão, apesar do tratamento ora irônico, ora pedante, que a maioria dos meios de comunicação dispensa ao ex-presidente Lula, está cada vez mais difícil esconder o bom desempenho do PT neste pleito.

Quem profetizou um fiasco de Lula precisa improvisar teorias para justificar verdades óbvias.

Quem chegou ao exagero de anunciar um duelo entre Lula e Geraldo Alckmin, em São Paulo, precisa fazer um curso supletivo de liderança política.

O mais novo argumento é dizer que o eleitor está desanimado, cansou-se da polarização entre PT e PSDB.

É preocupante. Nem faz muito tempo assim que os brasileiros recuperaram o direito de votar para prefeito de capital, que fora suprimido pela ditadura, e já tem gente que acha que esse tipo de coisa é cansativa e tediosa. É a mesma turma que, em dia de eleição, só consegue olhar para os santinhos na calçada e dizer que eles emporcalham a cidade. Eu acho que nada emporcalha mais uma cidade do que o autoritarismo, a falta de eleição, os prefeitos escolhidos de forma indireta.

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PT retomará debate sobre a mídia?

21/10/2012

Por Altamiro Borges

Em sua visita à Argentina nesta semana, o ex-presidente Lula foi explícito ao defender a urgência da regulação da mídia no Brasil. Em entrevista ao jornal La Nación, que faz oposição à presidenta Cristina Kirchner e ataca diariamente a Ley de Medios aprovada no país vizinho, ele não vacilou: “Precisamos instalar uma discussão política sobre um novo marco regulatório da comunicação”. Na mesma semana, dirigentes do PT anunciaram que retomarão este debate após as eleições. Será que agora a coisa anda?

Para Lula, os grupos monopolistas da mídia também precisam ser avaliados pela sociedade. “Eu penso que poucos líderes políticos do mundo foram e são tão criticados pela imprensa como eu. No entanto, não reclamo. Eu nunca tive a imprensa a meu favor e não é por isso que deixei de ser presidente com a maior aprovação de meu país. Devemos acreditar na sabedoria dos leitores, dos ouvintes de rádio e dos telespectadores. Eles saberão julgar os valores e o comportamento da imprensa”.

“Acredito que no Brasil precisamos instalar a discussão política sobre um novo marco regulatório da comunicação. A última regulação é de 1962. Não há nenhuma explicação para que no século 21 tenhamos a mesma regulação de 1962, quando não havia celulares, nem internet. A evolução nas telecomunicações não está regulada… No Brasil houve uma conferência nacional com a participação de partidos, veículos de comunicação, empresas de telefonia, que elaborou uma proposta de regulação. Ela precisa ser discutida com a sociedade”.

Eleição só acaba quando termina

20/10/2012

Por Eduardo Guimarães no Blog da Cidadania

Após quase noventa dias de massacre midiático do Partido dos Trabalhadores perpetrado graças à muleta eleitoral oposicionista em que se converteu o julgamento do mensalão, a eleição em São Paulo adquiriu um caráter de detergente da alma de dezenas de milhões de brasileiros, sejam militantes filiados ao partido, sejam simpatizantes como este que escreve.

Durante esse trimestre obscurantista, o que há de mais reacionário, corrupto e rico no país elucubrou previsões tenebrosas sobre a destruição moral e física do partido mais querido pelos brasileiros e do ex-presidente da República que, dois anos após deixar o poder, continua campeão de popularidade.

Os desejos e previsões nazifascistas do PSDB, do DEM, do PPS, da Globo, da Folha, da Veja, do Estadão, dos “colunistas” desses veículos, do procurador-geral da República e de parcela dos ministros do STF de que a farsa encenada naquela Corte causaria “efeito eleitoral” contra o PT acabaram ganhando um termômetro: a disputa eleitoral entre Fernando Haddad e José Serra.

Não faltaram previsões de que Lula, por conta do julgamento, estaria liquidado como arquiteto de fenômenos eleitorais como Dilma Rousseff. Afinal, parecia improvável que, no momento em que a própria cúpula do Judiciário se engajava politicamente, o partido que diziam que caminhava para a extinção conseguisse vencer onde suas dificuldades eleitorais eram maiores.

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Serra e o manual do jornalista

17/10/2012

 

Por Paulo Henrique Amorim, no blog Conversa Afiada:
 
Nesta terça-feira, na rádio que troca a notícia, o Padim Pade Cerra desqualificou de forma violentaa pergunta de um dos jornalistas mais respeitados em São Paulo, Kennedy Alencar.Tratou o jornalista como um meliante, um desqualificado.

Kennedy queria saber como ele analisava o kit gay que lançou como governador de São Paulo e a incongruência de sua campanha, que estigmatiza o kit gay do Ministro da Educação, Fernando Haddad.

(Clique aqui para descobrir com o Vladimir Safatle quem é o responsável por transformar homossexuais em reféns de campanhas eleitorais.)

É a mesma história do aborto: em 2010, ele criminalizava a Dilma por causa do aborto, e a mulher dele admitia que tinha feito aborto no Chile.

Diante da violência de hoje, editores do Conversa Afiada se lembraram deste texto que o ansioso blogueiro escreveu durante a campanha de 2010.

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A lógica da cidade dividida

16/10/2012

 

 Por Saul Leblon no site Carta Maior

 

São Paulo quase não enxerga suas periferias e favelas, que chegam à opinião pública filtradas pela geografia e as más notícias, ecoadas de um bantustão remoto.

O jornalismo sobre esses lugares –com raras exceções– alterna episódios de execuções e massacres; mais recentemente, incêndios. É o vínculo que ressalta em relação ao poder público. Sangue, repressão e desamparo.
Trinta e três favelas arderam este ano em SP. Transparências superpostas desenham semelhanças suspeitas entre o rastro das chamas e o da cobiça imobiliária.

As labaredas iluminam também o descaso. O consórcio Serra/Kassab não liberou nenhum centavo do programa de prevenção de incêndios em favelas em 2012 — ano que SP viveu a segunda maior seca da sua história. Passemos.

A narrativa da tragédia reiterada criou um analgésico em relação a esse mundo desautorizando qualquer expectativa de inovação.Nada. Exceto alguma melhoria incremental, impulsionada não por uma mudança intrínseca aos seus fundamentos, mas pela lenta aproximação do algoz, ‘o progresso’, que um dia se apossará do limbo, capitaneado pelas betoneiras do interesse imobiliário.

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